CLUBE DE LEITURA – Colectânea ou como pedalar em conjunto

Felizes as coincidências que afinal existem e transformam as votações mais inocentes em montras de escrita. A maioria decidiu, está decidido! Sem qualquer pressão, os livres votantes votaram.

As vicissitudes implícitas à obra em causa, implicam uma gestão diferente e, por isso, como foi até sugerido, serão lidos todos os contos de per si, cada um com direito a comentários, criticas, sugestões, arrasos (poucos), teorias, opiniões, etc.

Cada um dos autores fica desde já convidado a participar e a opinar também. Bicicletem-se!




P.S. Como a altura é festiva e pouco bloguista, lanço o primeiro conto em Janeiro. Até lá, despeçam-se do que não interessa e abracem o novo ano como acharem melhor!

FRASEANDO #30

Sexo, esse minúsculo ponto feminino, em torno do qual gira a máquina do mundo.

Carlos Drummond de Andrade




Carlos Drummond de Andrade
(1902 — 1987)

Histórias da Ponte (Bridge Tales)

O suor escorria pelas têmporas da pouca experiência. A mão que segurava a mão ditada pela sorte, tremia de dúvida enquanto as honras gritavam: passa! Passa! Passados, estavam os restantes elementos da mesa que (des)esperavam pela licitação (não uma resposta lícita, mas uma oferta estudada) espremida na voz seguinte. Por conseguinte, o tempo não esperava naipes nem contas. Deixem-se de afrontas.

Por esta altura, a Dama de Copas aplicava uma chapada a um atrevido Valete de Espadas que espreitava sobre o decote da carta do lado. Malvado. O Rei de Ouros olhava impávido e sereno enquanto as contas se repetiam: três e dois cinco e um seis, balançado. As demoras davam para tudo, uns bufavam, outros fumavam (mentalmente), alguns dormiam.

- Dois sem trunfo!

Até a Dama irritada estancou a chapada. Com seis pontos?! Mas já se aplicam descontos? Enquanto os “cegos” vaguearem pelas mesas da aprendizagem, alguém que nos dê coragem! Fechada a contenda, sem emenda, que o mal, mal feito está, segue-se o carteio. Não há receio. Pior é difícil… ou então não.



O olhar atento do Mestre fazia cócegas de nervura na nuca do aprendiz, que é como quem diz: estamos claramente no reino da invenção! E porque não? Escorregar faz parte do cair e cair faz parte do caminhar. Já agora levante-se, pode ser?! É que tanto desenvolvimento, sobretudo mau, o que eu lamento, impressiona-me a compreensão. Mas onde é que aprendeu isso? Foi mais ou menos, ligeiramente muito mal jogado.

Satirizada a iniciação dos demais, fica a nota (que importa) para tudo o que há-de vir. Muitas horas, sempre sem batota, serão jogadas e escritas a seguir. Os mais atentos, experimentados ou de maior envergadura, poderão responder claramente: mas afinal qual foi a abertura?

Responda quem quiser.

CLUBE DE LEITURA – Colectâneas

Motivados sabe-se lá porque acontecimento, decidimos (sim todos) colocar para votação, e pela primeira vez, colectâneas de contos de vários autores (engraçado como as colectâneas podem ser de vários). Uns que se estreiam, outros que se estranham outros ainda que se entranham e muitos que se espalham (incluindo um tal de Aragonez). Por proximidade à causa e à presença nos respectivos lançamentos, decidimos (sim, já disse… todos) enunciá-los por ordem cronológica da sua publicação. Posto isto e mais os factos:


1 – Contos Policiais – : Dulce Maria Cardoso, Francisco José Viegas, Gonçalo M. Tavares, Hélia Correia, Mafalda Ivo Cruz, Mário Cláudio, Rui Zink, valter hugo mãe e Ricardo Miguel Gomes.



«É um crime, caro leitor. Um crime! A vítima somos nós, leitores portugueses, e não há dados que nos apontem para um possível assassino. É praticamente um dado unânime que a literatura portuguesa é vítima de um crime de ausência: a do policial entre a nossa ficção. (...) Talvez a melhor solução seja mesmo um livro de contos policiais, com uma mira atirada à própria cultura de um país. Daí este livro que tem em mãos...» Pedro Sena-Lino

Nove destemidos autores portugueses aceitaram o desafio de escrever um conto policial. O resultado desta perigosa experiência é um tiro certeiro: nove contos policiais de alto calibre!

Coordenada por
Pedro Sena-Lino, esta colectânea de Contos Policiais é a obra inesperada do ano (2008), com incalculável valor literário.



2 – Contos de Vampiros – Ana Paula Tavares, Gonçalo M. Tavares, Hélia Correia, João Tordo, Jorge Reis-Sá, José Eduardo Agualusa, Miguel Esteves Cardoso, Rui Zink e Susana Caldeira Cabaço.



«É essa a substância, a natureza do vampiro: fazer temer a invasão do outro no meu espaço corporal, no primeiro e mais claro reduto da minha identidade. E assim perder a própria existência, metamorfoseando-me no outro. Atenção, caros leitores: porque ao ler este livro é isso que está em jogo - perder a própria identidade!»
Pedro Sena-Lino (in Nota Introdutória)

Por favor não me leia o pescoço. Lembra-se do filme? Agora tem um livro: nove terríveis contos de vampiros, originais e assinados por autores portugueses contemporâneos, directamente para os seus maiores receios de leitor! A partir do momento que iniciar a leitura, a responsabilidade é inteiramente sua.

Coordenada por
Pedro Sena-Lino, a colectânea que satisfaz os desejos mais obscuros de qualquer leitor!



3 – Bicicletas para Memórias e Invenções 5 – Alberto Pereira, Ana Alves Oliveira, Ana Prado, Bárbara Guerreiro Nunes, Daniel Escobar, Madalena Braz Teixeira, Manuel Alonso, Manuela Fabião, Miguel Aragonez, Pedro Ladeira Barros e Rodrigo Miquelino.



Trazer para a luz: o trabalho que procuramos desenvolver nos cursos de escrita criativa da Companhia do Eu. Trazer para a luz ideias, talentos, histórias, dentro de cada aluno que escreve; e depois desse processo, trazer para a luz o próprio conto (…) Porque a luz só é luz se for partilhada.
Pedro Sena-Lino (in Nota Introdutória).


Sem qualquer pressão ou influência (como sempre) eu sei onde é que moram! Por isso muito cuidadinho com a votação sim?! Se tiverem dúvida votem na capa mais bonita, ou mais cor-de-laranja, ou que tenha uma bicicleta, por exemplo.



P.S. - Se clicarem nos títulos podem saber mais qualquer coisa sobre os respectivos lançamentos.

FOI JÁ ONTEM!!

Todos os inícios têm um começo e ontem começou um deles. Na casa de um coleccionador, 11 bravos sonhadores lançaram para a fogueira da opinião pública as achas da sua criatividade. Sem credo nem idade, todos se juntaram num só.

Um onze avos do meu sonho foi disparado na direcção de um qualquer alcançar distante, cheio de esperança no amanhã da escrita. Os momentos que nos marcam são preenchidos pelas presenças e pelo apoio dos que se demonstram. Obrigado a todos por tudo.




Algum interessado na leitura poderá adquirir um exemplar (bem como da agenda) aqui pelo mail do blog (envio à cobrança) ou directamente na Companhia do Eu, a verdadeira responsável pela concretização de todos estes sonhos.

Deste que s`assina,

Miguel Aragonez
(o “homem” da página 135)



P.S. - O livro irá constar da próxima votação do Clube.


É JÁ AMANHÃ!!


Escatologias e outras tias

Antes:

Esforço de vontade, desconta a idade, defende a verdade e ajuda a saudade.

Mudança de rumo, abraços de desuno, viagens com sumo e piadas de aprumo.

Balde que se atina, limpa a latrina, vontade que se fina e mais uma dose de urina.

Vida de cão, de gato também não, quintal de ilusão e pêlo na mão.

Passa depressa, aspira a conversa, esfrega a travessa e limpa o que não interessa.

Come mais um, o outro dá pum, rosna algum e cheira a bedum.



Depois:

Pisa mais ao lado, humor está fechado, o prazo estragado e está tudo cagado.

Perde o sapato, foge o imediato, sacode o teu fato e já mija mais um gato.

Ladra uma mão, puxa que não, vive na prisão e nasce um cag*lhão.

Mijo que se entrega, amarelo de refrega, chão que escorrega, e só mais uma esfrega.

Pêlos que abalroam, olhares que até soam, cheiros que se entoam e merdas que voam.

Cão lambe ameixa, gato que é gueixa, silêncio que não deixa e da vida… quem se queixa?!


FRASEANDO #29

O talento não basta para fazer o escritor. Atrás do livro deve haver o homem.

Ralph Waldo Emerson



Ralph Waldo Emerson
(1803-1882)

EU VOU LÁ ESTAR!



P.S. - ... e o Miguel Aragonez também!


Bairro da vida

O sonho acordou a meio do fim pouco depois de ter iniciado. Espreguiçou o espanto e olhou para o relógio: faltavam poucos minutos para depois. Decidiu dormir mais um pouco. Lá fora, a chuva despedia-se da noite e abraçava os primeiros raios da manhã.

Algumas portas ao lado a doença tinha começado a acabar. Fazia as malas dos últimos dias e preparava-se para mudar de corpo. Tinha cumprido a sua missão ali, fazendo o possível por deixar bem vincada a tosse, a febre e as dores de tudo e mais alguma coisa.

No andar de baixo, a partilha dava as mãos ao destino e reforçava os laços de vida com um sincero amo-te. Tinham passado a noite enroscados no sofá a beber chá de alegria e a ver filmes de futuro com um sorriso nos lábios. Para aquecer o momento tinham-se tapado com a manta da tranquilidade enquanto se divertiam a baralhar pernas.

A satisfação pessoal, que morava na rua de trás, vestia os mais pequenos projectos de vida (a esperança, o amor e a certeza) e preparava as lancheiras da escola, revendo mentalmente todos os passos da rotina diária. Era fácil esquecer alguma coisa, afinal sempre eram 3 filhos e havia muito para preparar.

Na rua tudo começava a mexer: o tem que ser já colocava as frutas e legumes, tudo fresquinho, na direcção de quem passa; o outro dia alinhava as tesouras e os pentes esperando o primeiro cabelo que se viesse guilhotinar; o mais cedinho escrevia a ementa do dia enquanto arregaçava as mangas do pequeno-almoço que tinha que se tornar grande; a vida igual abria as persianas da montra depois de ter contado todos os botões, fechos, fios e sedas; o representante acordava o representado para que atendesse os fiéis que passassem as portas da necessidade em busca das primeiras respostas do dia; o frete dos outros varria os restos da noite alheia e baldeava a consternação mútua com água renovada de esperança.

Enquanto os mortos se conformavam os vivos não. Por todo o lado, tudo seguia o caminho de sempre enquanto todos se levantavam da profundeza do descanso para dar início a mais um dia de tanto.

Do alto, uma Estrelinha (a descansar do mar) observava com alegria a dádiva do dia que nascia lá em baixo. Satisfeita, afastou as nuvens para o lado e levantou-se para ir acordar o sol. Estava na hora.