Escritas da vida. Memórias do que se escreve ao longo desta aventura que é existir! Em 1992 rezava assim:
Não sei como é que alguma vez o dia se conseguiu casar com a noite, odeiam-se tanto!
Não se sabe bem como nem porquê, mas um dia, talvez por engano ou precipitação, dois seres muito diferentes juntaram-se e tiveram um filho. Foi a única altura em que se juntaram. A partir daí o filho nunca mais pôde estar com os dois ao mesmo tempo. De dia estava com um e de noite estava com outro.
Uma vez quase que os conseguiu juntar, era de dia e estava com o seu Pai e foi então que de repente começou a escurecer e o Pai disse que tinha que se ir embora. Quase ao mesmo tempo do outro lado o filho viu a sua Mãe atrás de uma nuvem. Foi ter com ela e disse-lhe:
- Mãe, anda para aqui que estou aqui com o Pai!
Ela parecia espreitar timidamente atrás da nuvem e quando finalmente se decidiu a ir ter com o filho já o Pai se tinha ido embora. Era de noite! Ao filho tinha-lhe parecido que a Mãe tinha esperado tanto de propósito… Por pouco o filho ia vendo o seu sonho de menino realizado, mas mais uma vez não conseguiu.
O filho tinha muito orgulho nos seus pais, apesar de terem feitios tão diferentes. O Pai era grandioso e imponente. Irradiava uma luz que até ofuscava quando se olhava nos olhos. Muito quente e compreensivo tentava sempre aproximar-se do filho brincando e conversando com ele. Já a Mãe era muito diferente. Dona de um brilho também esplendoroso era mais fria e calculista e não se deixava embalar com falinhas mansas de carinhos e ternuras. À sua maneira também ela se preocupava com o filho, mas sempre de um modo mais adulto, distante e racional, mesmo quando ele era pequenito.
O filho nunca soube com qual havia de ficar e era por isso que alternava sempre entre o dia e a noite. O Pai parecia sempre mais interessado em ficar com ele e por isso tentava irromper o mais possível pela noite dentro para ficar mais tempo com o seu filho (tinha mais sucesso no Verão!). A Mãe também queria estar com o filho mas não o demonstrava, mal o Pai começava a espreitar ela desaparecia num instante sem se despedir. Às vezes chegava mesmo a dizer ao filho:
- Se queres ter sempre o dia a escolha é tua!
Até hoje nunca lhe disse que gostava dele. Ele só achava que sim porque é normal as mães gostarem dos filhos.
O Pai apesar de pouco falador expressava muito mais os seus sentimentos ao filho e tentava por vezes tocar-lhe ao coração. Por seu lado o filho também nunca disse olhos nos olhos ao seu Pai o quanto gostava dele. É que o brilho ofuscava! Também nunca o dissera à sua Mãe com medo que ela não percebesse.
Como já devem ter percebido eu sou esse filho. Os meus pais são o Sol e a Lua, eu chamo-me Terra!
Não são certezas, não são identificações sentidas. São degraus do nosso crescimento, que compõem a escada que hoje somos. Agora é como é, na altura foi como foi. Longe vão os tempos...
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